19/04/2010

Experiência rica em detalhes

Por Jaqueline Bueno


Sempre com os pés no chão e uma visão administrativa aguda, Antônio José de Carvalho Alves,46, revelou-se um empreendedor. Há quatro anos, deixou o trabalho em uma empresa de médio porte que, segundo ele, era demasiadamente desgastante, para ficar mais perto dos dois filhos e da mulher. E conseguiu.


Sua sensibilidade é transmitida ao entrar pelo grande portão amarelo. O verde das plantas, o tapete no quintal feito com uma graminha que merece ser admirada com o orvalho da manhã. Ao fundo, a oficina de marcenaria onde passa cerca de 11 horas trabalhando. “Acho que é muito tempo, gostaria que fosse menos. Pensei em vir para cá e ficar mais tempo com minha família, e mesmo morando com eles acaba sendo impossível me dedicar como queria”. Mesmo assim, ele dá um jeitinho de jogar xadrez, ir ao clube e assistir filmes. “Ah, e jogar sinuca?”, interrompe a mulher Célia Regina. Com um ar risonho e a sutileza que emprega para fazer as peças, ele concorda e volta a falar das suas atividades. E nesse meio-tempo, comenta sobre uma de suas paixões. “Gosto muito de mexer com plantas, não sou especialista, mas entendo o suficiente para que elas sobrevivam”. Isso é demonstrado em suas criações: enormes rosas, quadros de flores, cabideiro de margaridas.


Com fala rápida e dificuldade para guardar datas, mostra os recortes de jornais, com o auxílio da mulher, datados em 30 de dezembro de 2002, em que aparece seu trabalho. Assis ganhou um toque na época do Natal com os objetos de madeira que decoraram o centro da cidade. Antônio não foi escolhido por acaso, venceu um concurso que lhe rendeu dois mil reais.


Na Avenida São Cristovão, em uma casa de muros altos e um grande portão está seu “show-room”, na edícula ao lado da oficina, dois cômodos guardam as mais belas peças esculpidas na madeira. De símbolo da justiça, passando por sacrário até pequeninas caixas, ele explica como faz cada uma delas. Antônio lembra do dia em que pediram a ele para fazer um genuflexório, começou a rir por não saber do que se tratava e achou que estivessem de brincadeira. Ainda hoje ao olhar para o estrado que serve para ajoelhar e orar, cai na gargalhada pela sua falta de conhecimento.


Desde pequeno gostava de desenhar. Paradoxalmente, aos 17 anos ingressou na universidade para cursar História, pensando em exercer arqueologia ou historiografia. Sua mudança para São Paulo fez com que desistisse desse sonho. Depois, por duas vezes consecutivas, prestou vestibular para Publicidade e Propaganda, mas não era sua hora de começar a graduação.


Permaneceu por 10 anos em seu último trabalho, antes de começar com a marcenaria. Durante este tempo teve a oportunidade de conhecer a Alemanha e os Estados Unidos onde ganhou experiência profissional e enriqueceu seu conhecimento cultural. Apesar da dificuldade com a língua estrangeira, conseguiu passar ileso e satisfeito. “Só não chegou a ser trágico, porque na Alemanha estive com um grupo de pessoas que entendia o idioma.”


Ele estuda minuciosamente suas peças, assim como fazia quando trabalhava no setor administrativo. Compra revistas, olha os desenhos e pensa como ficariam na madeira. Afinal, “obter sombras e relevos nesse tipo de trabalho é complicado”. E é com delicadeza e paciência que, aos poucos, o esboço se transforma em obra de arte.


Uma de suas características é não assinar mais os seus quadros, “porque algumas pessoas não estão interessadas em quem faz e sim no que se faz”, acentua.


Célia acha que o marido é criativo, mas “centraliza muita coisa nele, a prioridade é o trabalho”, diz olhando para o lado e dando um risinho para ter certeza de que não estivesse ouvindo.


Sua pequena empresa conta com seis funcionários, a esposa que faz o atendimento ao público e sua mãe, D. Umbelina de 74 anos, o ajuda na linha de produção, fazendo o acabamento das peças.


Os funcionários concordam que inventividade combina com esse artista. Exigência e perfeccionismo estão no mesmo patamar. E, acima de tudo é cuidadoso e prestativo.


Marceneiro, administrador, desenhista e mais um bocado de características que ele possui. Antônio, mostra com um sorriso, que a vida é baseada na tentativa de conseguir o melhor para si mesmo.


*Texto escrito em 2008 e publicado em julho de 2009.

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